AS
GRANDES IMAGENS DO EVANGELHO DE SÃO JOÃO NO LIVRO
JESUS
DE NAZARÉ DE
JOSEPH RATZINGER
JAQUELINE BALTHAZAR SILVA
ÁGUA
Origem da vida. Simboliza também a
origem da humanidade. Pode aparecer de diversas formas para o homem e em diversos
sentidos.
Fonte:
água fresca que brota do interior da terra. Fonte é princípio em sua límpida e
imaculada pureza. A fonte é o elemento criador, símbolo de fecundidade e
maternidade.
Rio:
grandes correntes são doadoras de vida (Nilo, Eufrates, Tigre). Em Israel o rio
Jordão representa e oferece a vida ao país. No Batismo de Jesus a profundidade
do rio representa também o perigo. Mergulhar na profundidade significa a morte
e a emersão o renascimento.Por isso no batismo morremos para o pecado e renascemos
em Cristo.
Mar:
majestoso e admirável por sua potência; temido. É o espaço vital do homem. Deus
marcou os limites da terra com o mar. O mar não deve ultrapassar os seus
limites. A passagem pelo mar vermelho representa a redenção para o povo de
Israel e uma ameaça fatal para os egípcios.
No Batismo a passagem pelo mar
vermelho é primeiramente representada como a morte, é um prenúncio da imagem do
mistério da cruz. O homem, para renascer, precisa entrar com Cristo no mar
vermelho; mergulhar com Ele na morte para só então alcançar uma nova vida com o
ressuscitado.
Simbolismo
histórico-religioso no Evangelho de João: percorre o evangelho do princípio
ao fim.
Conversa
com Nicodemos (cap. 3): o homem deve renascer da água e do espírito para
entrar no Reino de Deus; Deve tornar-se outro.
Batismo
– entrada na comunidade de Cristo; renascimento; analogia ao nascimento
natural. Se o nascimento natural acontece a partir da fecundação masculina e
concepção feminina, no batismo o duplo princípio se dá entre o espírito divino
e a água.
O
renascimento se dá pelo poder criados do Espírito de Deus. Espírito e água; céu
e terra; Cristo e Igreja estão intimamente relacionados – assim acontece o
renascimento. A água está no sacramento pela terra, pela Igreja que acolhe em
si a criação e a representa.
Jesus
no poço de Jacó (cap.4): Jesus promete à samaritana água viva. O simbolismo
do poço representa a história da salvação do povo de Israel. Desde a revelação
de Natanael Jesus já tinha sido revelado como o novo Jacó. Jacó é o antepassado
que ofereceu o poço como elemento fundamental da vida. Porém o homem possui uma
seda ainda maior do que da água da fonte. Procura uma vida para além da esfera
biológica. A promessa da nova água corresponde à outra dimensão de vida. São João
distingue bios de zoe, ou seja, enquanto a samaritana fala da
água física Jesus fala da água do espírito (o pneuma) que gera a vida e sacia a
sede mais profunda.
Capítulo
5: a água aparece só de passagem. A história do homem na piscina de
Betsaida. Esse homem estava doente havia 38 anos. Acreditava que se entrasse na
piscina ficaria curado. Jesus o cura pelo Seu poder. Jesus é a água viva.
Capítulo
7: Jesus está na festa dos Tabernáculos no rito solene de aspersão da água.
Capítulo
9: Jesus cura o cego de nascença. Para que o processo de cura se dê por
inteiro é necessário que o cego se lave na piscina de Siloé. A palavra Siloé
quer dizer “o enviado”. Só depois de lavado que ele alcança a visão. A
representação da piscina quer dizer que Jesus é o enviado, por isso a razão
autêntica do milagre. É em Jesus e por Jesus que o cego é purificado e só por
Jesus recupera a visão. O capítulo nos revela a explicação do batismo que
significa que Cristo nos concede a luz e nos permite ver por meio do sacramento
(sinal).
Capítulo
13: última ceia – lava-pés. Revela a humildade de Jesus que se fez escravo
dos seus discípulos; o lava-pés é purificador, torna os homens capazes de se
sentar à mesa de Deus;
Na
paixão: a água aparece de modo misterioso. O soldado perfura-lhe o lado e
jorra água e sangue. Representa os dois sacramentos fundamentais da igreja:
Batismo (água) e Eucaristia (sangue) que brotam do coração aberto de Cristo.
Na
primeira Carta de João: imprime um rumo diferente: Jesus Cristo veio pela
água e pelo sangue e pelo Espírito. Até então se entendia e reconhecia o
batismo de Jesus como acontecimento de salvação. João polemiza ao transportar
esse batismo para a sua morte na cruz. Assim água e sangue se unem pelo
Espírito.
Festa
dos tabernáculos (vs 37 – 39): Jesus levanta-se, no último dia da festa, e
diz: quem tiver sede venha a mim e beba, do seu interior correrão correntes de
água viva. O rito da festa consistia em se tirar a água da piscina de Siloé
para levá-la ao Templo no sétimo dia. No sétimo dia os sacerdotes davam sete
voltas em torno do altar com a água em um vaso dourado antes de fazer a
aspersão. A festa tem origem nas religiões da natureza, era, antes, uma oração
de súplica pela chuva. Mais tarde tornou-se uma recordação histórico-salvífica da
água que Deus tinha dado aos judeus durante sua peregrinação pelo deserto.
Água
que brota do rochedo: tema de esperança messiânica. Moisés tinha dado ao
povo o pão do céu e a água do rochedo. Israel esperava o novo Moisés, o
Messias. São Paulo escreve em sua primeira carta aos Coríntios que todos
comeram e beberam o alimento e a bebida do espírito da rocha que era o próprio
Cristo. Jesus se proclama o novo Moisés, a rocha viva que dá vida. Jesus se
revela como a água viva que mata a sede profunda – sede de viva plena – saciada
no interior do espírito.
Do seu
corpo jorrarão torrentes de água viva. Várias interpretações foram feitas sobre
o Corpo de quem a Escritura estaria falando. Uma corrente entende que todo
homem que acredita se torna, ele mesmo essa fonte de água viva (tradição
alexandrina de Orígenes – São Jerônimo e Agostinho); outra, a tradição da Ásia
Menor entende que esse “corpo” é o próprio corpo de Cristo. Só ele é a fonte, a
rocha viva da qual brota a água nova. Essa tradição está mais próxima de São
João e tem como seguidores S. Justino, Sto Irineu, Sto Hipólito, S. Cipriano,
Sto Efrem.
A primeira interpretação é mais
próxima dos Santos Padres e dos grandes exegetas do ponto de vista lingüístico,
porém, no ponto de vista de conteúdo é mais próxima da segunda. Por isso é
provável que João falasse do corpo de Cristo, embora não se exclua a
possibilidade de estar implícito também aqueles que aderem a Ele porque
tornam-se um com Ele. Ratzinger não exclui nem uma nem outra interpretação.
Como João sempre foi ambíguo não se pode deixar de pensar que aqui também o
tenha sido.
VIDEIRA
e VINHO
Assim como a água é um elemento
fundamental para a vida, o trigo, o vinho e o azeite fazem parte da cultura do
mediterrâneo. O pão é o fruto da terra o vinho alegra o coração e o azeite dá
brilho ao rosto. Ao lado da água os dons da terra tornam-se sacramentais da
Igreja. Os frutos da criação são sinais da ação histórica de Deus nos quais nos
oferece sua proximidade.
O pão é feito com a água e com o
azeite, frutos da terra, mas, precisam do elemento fogo que representa o
trabalho humano. O vinho corporiza a festa. Permite ao homem sentir a glória da
criação. Por isso pertence aos rituais do sábado, da Páscoa, das núpcias –
pressentimento de festa definitiva entre Deus e a humanidade.
O
milagre de Caná
Qual
o sentido de Jesus ter arranjado tamanha fartura de vinho? (520 litros)
Não
se trata de luxo privado e sim de algo muito maior. É importante observar que o
evangelista menciona que no terceiro dia houve uma boda em Cana da Galiléia.
Essa informação é a chave de leitura para o acontecimento. No antigo testamento
o terceiro dia representa a teofania: ex – Encontro de Deus e Israel no Sinai,
prenúncio da teofania decisiva na história.
A ressurreição de Cristo é a irrupção definitiva de Deus sobre a terra.
Quando
Jesus diz que a sua hora não chegou pode-se compreender que ele não atua por si
só mas pela vontade do Pai. A glória de Jesus não começa ali, mas em conjunto
com a cruz e a ressurreição. O milagre de Cana é uma antecipação da hora da
glorificação. O acontecimento de Cana é um sinal de Deus sobre a
superabundância. Representa a boda de Deus com o seu povo. Jesus é o noivo.
Para
entendermos a profundidade cristológica das bodas de Cana precisamos ter presente
que a água serve para os rituais de purificação, ao se transformar em vinho
torna-se sinal de alegria. A purificação ritual permanece, porém, pelo vinho o
dom de Deus oferece-se a nós e se torna na festa da alegria.
Costuma-se fazer um paralelo entre as
bodas de Caná e o mito de Dionísio, o deus que descobriu a videira. Filon de
Alexandria deu um novo sentido à história. O verdadeiro doador do vinho é o logos
divino. Ele é que nos dispensa a alegria, a doçura, o contentamento do
verdadeiro vinho. Filon fixa essa teologia do logos histórico-salvificante
em Melquisedec que ofereceu a Abraão pão e vinho. Ele nos oferece os dons
essenciais para a existência humana (o logos aparece como o sacerdote de
uma liturgia cósmica).
É pouco provável que João tenha
pensado nessa teologia, porém, o próprio Jesus quando explica sua missão chama
a atenção para o salmo 110(109) que fala sobre o sacerdócio de Melquisedec (cf
Mc 12,35-37). A Carta aos Hebreus também é muito próxima de João e, portanto,
para João Jesus é o logos, o Senhor que nos dá o pão e o vinho.
Capítulo
15
Jesus agarra-se no contexto dos
discursos de despedida que estava na antiga tradição. Por isso é preciso
considerar um trecho do Antigo Testamento para melhor compreender essa
tradição. Em Isaías 5, 1-7 encontramos o cântico à videira, provavelmente tenha
sido cantado na festa dos tabernáculos. A vinha era a imagem de uma noiva. O
cântico começa falando do amigo que plantou uma videira de boa qualidade em um
terreno muito fértil e fez de tudo o possível para seu crescimento. Na
sequência o tom do canto fica triste. A vinha não produz frutos bons, apenas
algumas uvas verdes intragáveis – isso quer dizer que a noiva foi infiel,
desiludiu a confiança, a esperança e o amor que o amigo esperava. Logo o amigo
abandona a vinha ao saque, atira a noiva para a condição de solteira que ela
mesma se atribui.
Explicando: a vinha é a noiva, a
noiva é Israel – são os ali presentes diante dos quais Deus ofereceu na Tora
o caminho correto. Deus fez tudo e como resposta recebeu a transgressão da lei
e um regime ilegítimo. A história acaba com o abandono de Israel por Deus. O
salmo 80 descreve Como Deus fez para salvá-los do Egito e depois os abandona
para serem saqueados, é uma salmo de lamentação que se transforma em um pedido
para que Deus cuide de sua vinha, que restaure-lhes, que o rosto do Senhor
brilhe para eles para que sejam salvos (Sl 80, 16-20).
Jesus vivia esse clima de mudanças
históricas que aconteceram desde o exílio e via que, no fundo, a situação não
havia mudado e isso falou ao seu coração. Em outra parábola contada pouco antes
de sua paixão Jesus toma de Isaías a imagem da vinha, essa contada em Mc 12, 1-12. A vinha é a imagem de
Israel representada nos rendeiros cujo dono partiu em uma viagem e que mesmo
estando longe exige os frutos devidos. A história do sempre renovado esforço de
Deus para com Israel é representada na sequência de servos que foram enviados
em nome do Senhor para buscarem os frutos devidos. Isso nos remete a história
dos profetas que foram enviados, seus sofrimentos e a inutilidade de seus
esforços que, na narrativa dos rendeiros, acabam sendo assassinados. E, por
fim, o proprietário envia seu próprio filho amado, o herdeiro e os rendeiros o
matam para poderem ficar com a vinha para eles. O que o dono da vinha faz?
Jesus retoma para o seu tempo e explica que assim como os profetas foram
maltratadas e mortos ele também o será.
Trazendo para o nosso tempo podemos
perceber que a modernidade fez a mesma coisa, declarou Deus como morto e quis
ser ela mesma o próprio Deus. Somos os senhores do mundo, não pertencemos a
nenhum outro senhor que não nós mesmos. Abolimos Deus das nossas vidas, nós
somos a medida das coisas. A vinha é nossa. O que acontece com o homem e com o
mundo?
Em Isaías não era possível ver a
promessa, no salmo diante da ameaça o sofrimento transforma-se em oração. Assim
foi a situação de Israel, é a situação da Igreja e de toda a humanidade.
Vivemos na obscuridade das provações e clamamos por Deus. Jesus nos responde
que precisamos cuidar da vinha porque do contrário o senhor virá tirá-la de
você. Jesus diz que ele é o filho que será morto e que será a partir dele,
morto e ressuscitado que Deus levantará no mundo uma nova construção, um novo
Templo. A imagem da vinha será abandonada para surgir uma nova imagem, a
construção viva d Deus. O poema da vinha não termina com a morte do filho, abre
o horizonte para uma nova ação de Deus. Deus permanece fiel sempre, apesar da
nossa infidelidade.
A parábola da videira no discurso de
despedida de Jesus permeia toda a história do pensamento e do discurso bíblico
que leva a profunda verdade de Jesus: “Eu sou a verdadeira videira”. Jesus
deixou-se plantar na terra pelo mistério da encarnação. No filho o próprio pai
se tornou videira e essa videira não poderá ser arrancada nunca mais. Esse é o
novo grande passo da história da salvação: na encarnação, morte e ressurreição
Jesus realizou em si o Sim a tudo o que Deus prometeu.
Desse modo, sendo ele a videira,
une-se a nós e nós nos unimos a Ele. Unidos a ele estaremos unidos ao Pai.
Embora a vinha não possa mais ser arrancada, saqueada, precisa de purificação,
para isso somos chamados a estar em e a estar com o Filho na
videira. A purificação visa o fruto: justiça, retidão pautadas na vontade e na
palavra de Deus. A parábola da videira aparece no contexto da Última Ceia,
depois da multiplicação dos pães. Jesus já havia falado do pão do céu –
pré-significação do pão eucarístico. Permanecer na videira é perseverar apesar
das dificuldades, o bom vinho nasce da perseverança. O fruto que devemos
produzir é o amor e o amor procede de Deus, por isso, precisamos permanecer em
Deus para mantermos a unidade.
PÃO
Jesus se torna o pão para a
vida, por isso não aceitou a tentação do demônio de transformar pedra em pão.
Ele mesmo é o pão da vida. A multiplicação dos pães torna-se o sinal da missão
messiânica de Jesus, mas torna-se também o seu caminho para a cruz.
O contexto principal da
multiplicação dos pães coloca o contraste entre Moisés e Jesus. Logo após a
multiplicação e pouco antes de ser proclamado rei João apresenta a seguinte
frase: “Esse é verdadeiramente o profeta que deve vir ao mundo” (Jo 6,14).
Moisés tinha oferecido o maná, o pão do céu que alimentou o povo peregrino.
Moisés falava com Deus e trazia aos homens a palavra de Deus, porém nem mesmo
Moisés viu o rosto de Deus. Jesus é o único que viu a face de Deus porque ele é
Deus. Por isso João coloca esse contraste entre Moisés e Jesus. Jesus fala a
partir da visão do Pai. Moisés era o mediador entre Deus e os homens. Os dons
de Moisés encontram em Cristo sua forma definitiva. Por isso o povo tinha em
Moisés a autêntica distinção de Israel que era conhecer a vontade de Deus e o
caminho correto para a vida. Assim o povo de Israel compreendia que o
verdadeiro alimento que levava a Deus era a lei de Deus. Jesus queria mostrar
aos judeus reunidos na sinagoga que a multiplicação dos pães era um sinal de
salvação espiritual, porém o povo só entendeu como salvação material, assim
como o maná, o pão é alimento terreno, o povo terá sempre fome de um algo a
mais que está em outro plano. A Tora é o alimento que vem de Deus, mas só
mostra as costas de Deus como mostrou a Moisés. Jesus, por outro lado, é o pão
vivo descido do céu que dá vida ao mundo (Jo 6,33). Os ouvintes da sinagoga não
compreenderam isso e Jesus precisou ser mais claro: “Eu sou o pão da vida, quem
vem a mim nunca mais terá fome e quem acredita em mim nunca mais terá sede” (Jo
6, 35).
A Lei tornou-se a própria pessoa de
Cristo e por isso, nos alimentamos do próprio Deus vivo, o pão do céu. Deus se
torna pão para nós primeiramente na encarnação do logos: a palavra se
fez carne, torna-se um de nós e assim se torna acessível a nós. Jesus diz que
sua carne é vida para o mundo.
A teologia da encarnação e a
teologia da cruz são inseparáveis. No discurso de Jesus sobre o pão vemos o
movimento da encarnação ao caminho pascal que é orientado para o sacramento.
João quer mostrar desde o prólogo que o fim último é a oblação do corpo de Jesus
na cruz, Jesus torna-se homem e se doa em sacrifício no lugar dos animais que
eram usados como cordeiro. Ele agora é o verdadeiro e único Cordeiro de Deus.
No discurso sobre o pão da vida encarnação e Páscoa são praticamente a mesma
coisa, são simultâneas assim como o sacramento da eucaristia é o maná que a
humanidade aguarda, a eucaristia é o grande encontro do homem com Deus no qual
o Senhor se dá em carne para que nos tornemos com ele espírito penetrados em
Deus, uma nova humanidade. Esse alimento é a abertura para uma nova passagem:
pela cruz antecipa-se uma nova existência da vida em Deus e com Deus.
Ao final do discurso sobre o comer e
beber a carne e o sangue está escrito: “O Espírito é que dá a vida, a carne não
serve para nada”. Recordando as palavras de Paulo: o primeiro Adão era uma alma
viva o último Adão tornou-se o Espírito que dá a vida (1Cor 15,45). Sublinha-se
a perspectiva do sacramento: por meio da cruz e da transformação a carne se
torna acessível ao processo de transformação cristológica e cósmica.
Em João a narrativa do Domingo de
Ramos está na perspectiva da Igreja universal que inclui judeus e gregos num só
povo. No pão está todo o mistério da paixão: “Se o grão de trigo não for
lançado à terra e não morrer, permanece só, mas, se morrer, produz muito fruto”
(Jo 12,24). O pão pressupõe que a semente seja lançada à terra para que nasça a
espiga. O pão terreno pode ser portador da presença de Cristo porque leva em si
mesmo o mistério da paixão, pois une em si morte e ressurreição.
Nosso Deus é real. Jesus viveu de
fato num tempo e num espaço geográfico. Podemos encontrar relatos dessa
existência real. Jesus morreu e ressuscitou de verdade, isso é histórico, não é
mito.
PASTOR
A imagem de Pastor traz a missão
de Jesus através da história. Pastor era alguém instruído por Deus no Antigo
Oriente (babilônico e assírio); apascentar representa a imagem de governar. O
soberano justo é aquele que cuida dos fracos. Por isso a representação de
Cristo como o bom Pastor é a representação do rei justo. Essa representação
ilumina a realeza de Cristo.
Já o Antigo Testamento utilizava-se
dessa imagem em que o próprio Deus se apresenta como o pastor de Israel. Essa
piedade é bem resumida no salmo 23. Ezequiel também representa a imagem do bom
pastor quando diz que o próprio Deus buscará as suas ovelhas e as apascentará
(Ez 34, 13. 15-16). Ao reunir-se à mesa com os pecadores Jesus conta a parábola
das 99 ovelhas do curral e a única ovelha perdida. O bom pastor vai atrás da
ovelha perdida e, ao encontrá-la, cheio de alegria a carrega em seus ombros.
Jesus quer abrir os olhos de seus adversários para a passagem de Ezequiel e diz
que Ele, Jesus, só faz aquilo que Deus, como verdadeiro pastor anunciou:
procurar a ovelha perdida e trazê-la de volta para o rebanho.
Há uma mudança surpreendente da
imagem do pastor no livro de Zacarias 13,7 que diz que o pastor será ferido e
as ovelhas dispersas (Mt 26,31). Essa passagem quer dizer que o pastor suporta
a morte e introduz a última virada. É a imagem do redentor. Representa também a
imagem do filho de Davi que derramará a compaixão e a oração quando olharem
para o transpassado. “naquele dia haverá um grande pranto em Jerusalém tão
forte como o pranto sobre Adadremon na planície de Magedon... Naquele dia correrá
para a casa de Davi e sobre os habitantes de Jerusalém uma fonte para a purificação
dos pecados e de toda a impureza” (Zc 12,10.11; 13,1).
João liga a profecia de Zacarias a
Jesus como fonte para a purificação de todos os pecados e impurezas.
Interessante é perceber que o
discurso sobre o pastor começa com outra imagem: a imagem da porta do redil das
ovelhas. Aquele que não entrar pela porta é ladrão.O verdadeiro bom pastor
passa através de Jesus que é a porta. Jesus pede a Pedro que apascente suas ovelhas
– Jesus o chama também de porta e Pedro precisa responder 3 vezes que ama Jesus
para poder transpassar a porta e ser ele também o pastor.
Discurso
do Pastor – cap. 10
Quatro conteúdos essenciais são
evidenciados: O ladrão que vem para roubar, matar e destruir; o verdadeiro
pastor não tira a vida mas a dá; O homem vive da Palavra de Deus, da verdade e
do fato de ser amado por Deus. O homem precisa de Deus. Em João o sentido de
Jesus como pastor é que Jesus é a palavra encarnada que oferece a vida na
medida em que se dá a si mesmo. Ele é a vida. (Jo 1,4; 3,36; 11,25).
Segundo
motivo do discurso do bom pastor
É essencial o entendimento do pastor
que dá a vida por suas ovelhas. A cruz é uma livre oblação. “Ninguém tira a
minha vida, eu a dou livremente” (Jo 10,17). Jesus transforma um ato de
violência exterior num ato de liberdade.
Terceiro
motivo do discurso
O reconhecimento recíproco entre o
pastor e o seu rebanho. Ele chamas suas ovelhas pelo nome e as conduz. As
ovelhas O seguem porque reconhecem sua voz. Dois verbos são importantes aqui:
conhecer e pertencer, estão entrelaçados entre si. A reciprocidade de
conhecerem porque pertencem a Ele e Ele conhecê-las porque lhes pertencem.
Conhecer pressupõe um acolhimento interior, vai além da posse material.
Ex. nenhum homem pertence a
outro homem do modo como as coisas lhes pertencem. Os filhos não são
propriedade dos pais; Os filhos pertencem aos pais mas o são também igualmente
livres criaturas de Deus. Não pertencem a Deus como pose mas como responsabilidade.
Pertencem a Deus na medida em que aceitam a liberdade do outro reciprocamente.
Desse modo, também as ovelhas pertencem ao pastor não como coisas. Aí está a
diferença entre o verdadeiro pastor e o ladrão. O verdadeiro pastor dá provas
de seu amor e as quer livres. Pertencem a ele pelo conhecimento e
reconhecimento. O bom pastor conduz ao Pai.
Último
grande motivo do discurso
A unidade. O bom pastor deve reunir
suas ovelhas para estar em unidade com o Pai.O pastor, que é Deus, reúne a todos
num único povo. Fala das outras ovelhas que estão em outro redil. A promessa de
um só pastor e um só rebanho. “Fazei de todas as nações meus discípulos” (Mt
28,19). A missão universal: um só pastor. Embora seja uma imagem pastoril é
perfeitamente compreensível para o mundo urbano. Ele deu a vida por nós, ele é
a vida.